sexta-feira, 21 de abril de 2023

Poesias: Fabio da Silva Barbosa

 

A história de mais um

 

Acreditando em nada

Não conseguia escolher qual mentira seguir

Sem desejo de participar

Não conseguia sentir, ser ou estar

Sem cura para quem conseguiu perceber a farsa que sustenta este jogo de cartas marcadas

Não havia tratamento que o ensinasse a deixar de ver o que está a sua frente

 

Fingir ser forte só para causar boa impressão

Fingir ter fé só para encurtar o sermão

Fingir que a família vai bem só para retardar o fim do que se desintegra

Fingir que ainda existe para se camuflar entre os que seguem a regra

 

Tentou o médico mas só o que conseguiu foi aumentar seu tédio

Foi em algumas religiões mas nenhuma conseguiu o embalar ao som das suas enganações

 

Cada vez mais as coisas faziam menos sentido



Amor ao primeiro delírio

 

Escrevi duas linhas

e resolvi chamar de poesia

Levava todo o jeito de

                                   A única dúvida

era o que fazer com aquilo

Qual a serventia

Ofereci a você

como algo puro e sem hipocrisia

Você quis saber qual o sentido de fazer algo que de nada valia

            Peguei a poesia, abracei, dei colo

                                               Lancei um olhar apaixonado e disse

                                               Só você me entende



Ele não queria estar dentro

 

Não tinha redes sociais

Nunca usou pix ou uber

Aplicativo era uma palavra repulsiva

Estava completamente fora

desse mundo

de “facilidades” que escravizam,

esvaziam, limitam e controlam

Sempre se negou a fazer parte

Agora mais que nunca



O artista do protesto sangrento

 

Do fundo de seu porão

gritos e uivos em vão

 

Não suportava mais conviver

com a podre sociedade a lhe conter

 

Resolveu então elaborar um protesto

com vísceras, sangue e todo o resto

 

Sequestrou um padre, um pastor, um militar, um ministro e um delegado

para representar todo seu desagrado

 

Do padre e do pastor arrancou as pernas e os braços

Colocou as Partes de um no outro e os ajeitou em um fraterno abraço

 

Do militar e do delegado tirou apenas o escroto

Após terminarem de sangrar, colocou o de um na boca do outro

 

No ministro fez uma obra fecunda

Arrancou a cabeça e enfiou o nariz na ministerial bunda

 

Tinha ficado elegante, coisa para expor em museu

Nem ele acreditava que todo aquele talento era seu



O rebelde das letras

 

Não acreditava nas rimas

Mandou as redondilhas a merda

Não tinha paciência pra métrica

A tradição e antigas formas

lhe pareciam algo mais que chato

Brincava com as letras do seu jeito

mesmo desagradando aos que decoravam

toda aquela inutilidade de regras

Por mais que torcessem o nariz para sua produção

que era bom

era



Tentando me refugiar onde não existe para ver se consigo me livrar

 

Quanta frustração

e melancolia

temperados com angústias e aflições

 

E ainda dizem que a culpa é sua

como se fosse uma questão de escolha

submersa neste fluxo em descontrole

 

Mas o tédio

e o desespero 

mantém este desagradável cheiro

 

E você nunca será bem recebido

como aquela visita esperada

já que de seu corpo exala a fragrância errada

 

Tudo o que você falar

será considerada a mais pura besteira

já que a lógica imposta diz que você está sempre errado

 

O jeito é se afastar

sem nenhum humano encontrar

seria uma boa saída para deixar de atrapalhar

 

Mesmo não querendo sua companhia

eles vão aparecer para azucrinar

dando bom dia e dizendo querer ajudar

 

Que profunda e desagradável agonia

elevando ao máximo

seu nível de enlouquecimento

 

Já que nem ao menos consigo me exilar

pegarei a vida e darei uma encarada em seus olhos sarcásticos

a sacudirei pelos ombros e gritarei basta

 

BASTA!!!!



Turbulência crítica

 

Os planos deram errado

e tudo o mais rompeu-se em escombros

diante da sua figura

Resta apenas o nada como trunfo

pois o curinga já foi decapitado

sob as leis que mantém tudo em seu devido lugar

 

Quando você olhar em volta

pesquisando cada centímetro cúbico

não vai encontrar as saídas cuidadosamente camufladas

Portas abertas apenas para alguns

bem nascidos

ou conhecidos de seu Fulano ou Beltrano

 

Com isso lhe resta a miséria

que o conduzirá rapidamente até este triste e amargo fim

coberto de desgosto e infelicidade

Não se sabe se é praga ou vítima de aparição

coisa de azar ou maldição

estarmos sendo aniquilados com a benção da indiferença

 

E assim segue o desastre

de geração em geração

sem saber para onde ir

Caminhando como cegos em tiroteios

sentindo o corpo se dissolver

ou correndo sem direção

 

 

Um misantropo hediondo por natureza

 

A solidão preenchendo

um ser tão vazio

quanto a existência

Um peito seco

rachado como a sola do pé

ou um solo árido

Não se sentia bem em grupos

ou se enquadrando a qualquer opção

Não sustentava rótulos

ou tinha convicções

Sozinho chegou

e mais sozinho ainda se foi 

 


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