terça-feira, 10 de maio de 2011

Navalha que corta, sangra e não se desculpa




William Novaes
Do Diário do Grande ABC


Mordaz, violenta e atual. O cenário é pobre e realista. O espectador tem a impressão de que está do lado de fora de uma janela acompanhando asquerosa relação de interesses e torturas físicas e psicológicas. Essas são as sensações da peça ''Navalha da Carne'', exibida na Caixa Cênica, no Sesc Pompéia, na Capital.

O texto de Plínio Marcos, conhecido na época como um dos autores malditos da literatura brasileira, ainda é cruel e contemporâneo. Em São Paulo, sai de cena o palco convencional, as cadeiras numeradas e uma coxia glamorosa. A encenação ocorre em espaço simples e muito original. Em uma caixa, sendo que na parte da frente está o cenário, uma cama, uma pia, varais e cabides.

Quem assiste sente o calor da respiração dos atores e os ecos das porradas, sejam físicas ou psicológicas. As cadeiras de botecos ficam aconchegantes, e em certos momentos, as posições lembram uma janela, onde é preciso se mexer para ver em melhores ângulos as maldades da peça. Apenas 50 sortudos têm privilégio de acompanhar o espetáculo por sessão.

Mesmo a estreia tendo sido realizada em 1967 e censurada pela ditadura militar, a história da prostituta Neusa Sueli, do cafetão Vado e do gay Veludo ainda encanta pela crueldade das falas, o cinismo das interpretações e a ousadia do local de exibição.

O diretor Rubens Camelo (ex-''Casseta e Planeta'') fez a primeira exibição fugindo do tradicional, no Rio de Janeiro em 2010, onde os atores se espremiam entre a plateia e os móveis de um quarto de hotel decadente. Para acompanhar a relação do cafetão Vado, interpretado maldosamente por Rogério Barros, com a sua provedora de um qualquer, a puta Sueli, magistralmente incorporada pela atriz Marta Paret e o gay esculachado Veludo, vivido por Rubens Queiroz.

A relação é nada cordial entre os personagens. Afinal todos se envolvem e brigam por meros trocados e as bordoadas e xingamentos parecem acertar todos que estão dentro da cena, inclusive o público. Vado é jovem, não quer trabalhar, Sueli é uma balzaquiana infeliz com a sua profissão e Veludo encarna uma bicha sem classe e bem-humorada. Entre gritos, tapas e maldades, algumas verdades são ditas e muito bem interpretadas em uma hora que parecem voar ao mundo da boca do lixo e das baixezas do ser humano.

Navalha na Carne - Teatro. No Sesc Pompéia - Rua Clélia, 93, Água Branca, São Paulo. Tel.: 3871-7700. Até 11/6, de quinta a sábado, às 21h30, no SESC Pompéia. Ingr.: de R$ 3 a R$ 12.



http://www.dgabc.com.br/News/5884752/navalha-que-corta-sangra-e-nao-se-desculpa.aspx, publicado 10/05/2011, acessado 10/05/2011.

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